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Cálculo Diferencial e Integral I

Solução do 1º Teste, versão A, 2016/11/11

  1. Considere os seguintes subconjuntos de $\mathbb{R}$: \[A=\left\{x\in\mathbb{R}: \left|2x+3\right|\gt5 \right\}, \qquad B=\left\{x\in\mathbb{R}^+: \log \frac{x}{\pi}\leq 0 \right\}.\]

    1. Identifique os conjuntos $A$ e $B$ e mostre que \[ C=A \cap B=\left]1,\pi\right].\]

      \begin{gather*}\left|2x+3\right|\gt5 \Leftrightarrow2x+3\gt 5\vee 2x+3\lt-5  \\ \log \frac{x}{\pi}\leq 0 \Leftrightarrow0\lt\frac{x}{\pi}\leq 1\end{gather*} pelo que $A=\left]-\infty,-4\right[\cup\left]1,+\infty\right[$, $B=\left]0,\pi\right]$ e portanto $C=\left]1,\pi\right]$.

    2. Indique os conjuntos dos minorantes e dos majorantes de $C$. Determine, se existirem,  o supremo e o máximo de $C\cap\mathbb{Q}$.

      O conjunto dos minorantes de $C$ é $\left]-\infty,1\right]$ e o dos seus majorantes $\left[\pi,+\infty\right[$. Assim sup$(C\cap\mathbb{Q})=\pi$ e não existe máximo.

    3. Decida, justificando, se são verdadeiras ou falsas as seguintes afirmações:

      1. Qualquer sucessão de termos em $C$ tem um sublimite (em $\mathbb{R}$).

        Verdadeira: como qualquer sucessão de termos em $C$ é limitada, o Teorema de Bolzano-Weierstrass garante que tem um sublimite.

      2. Qualquer sucessão decrescente, de termos em $C$, é convergente (em $\mathbb{R}$).

        Verdadeira: como $C$ é minorado, qualquer sucessão decrescente, de termos em $C$, é convergente (em $\mathbb{R}$).

      3. Se $(u_n)$ é uma sucessão crescente, de termos em $C$, então $(u_n)$ é convergente e $\lim u_n=\pi$.

        Falsa: por exemplo, $u_n=2-\frac{1}{2n}$.

  2. Considere a sucessão $(a_n)$ definida por \[ \begin{cases} a_1=1, &\\ a_{n+1}=\dfrac{n}{n+1}\; a_n^2, & \text{se $n\geq 1$.}\\ \end{cases} \]

    1. Use indução finita para mostrar que os termos da sucessão verificam $0\lt a_n\leq 1$, para todo o $n\in \mathbb{N}_1$.
      1. Para $n=1$ temos $a_1=1\in{]0,1]}$.
      2. Supondo que $0\lt a_n\leq 1$ para um certo $n$, provemos a afirmação análoga para $n+1$: \[a_{n+1}=\dfrac{n}{n+1}\; a_n^2\leq \dfrac{n}{n+1}\leq 1.\] Além disso, $a_n\gt0$ e $\dfrac{n}{n+1}>0$, logo $a_{n+1}\gt0$.
    2. Mostre que $(a_n)$ é uma sucessão decrescente.

      Com $n\in\mathbb{N_1}$, tem-se $a_{n+1}-a_n=a_n\left(\dfrac{n}{n+1}a_n-1\right)$.
      Dado que, por a), $a_n \in {]0,1]}$ e $\dfrac{n}{n+1}a_n\leq1$, vem $\dfrac{n}{n+1}a_n-1\leq0$ e portanto $a_{n+1}-a_n\leq 0$.

    3. Justifique que $(a_n)$ é convergente e calcule o seu limite.

      Pelas alíneas anteriores, a sucessão $a_n$ é limitada e monótona, logo é convergente. Se designarmos $\lim{a_n}=a$, obtemos
      $a=\lim{\dfrac{n}{n+1}}{a_n}^2=a^2$. Então, $a=0$ ou $a=1$. Como $a_1=1$ e a sucessão é decrescente e não constante, concluímos que só pode ser $a=0$.

  3. Calcule, ou mostre que não existem em $\overline{\mathbb{R}}$, os seguintes limites de sucessões:

    1. $\lim \dfrac{(-1)^n n}{2n^2+3}$,
    2. $\lim \dfrac{4^{n+1}-n^{10}}{n^8+4^n}$,
    3. $\lim \dfrac{1-\sen(3^n)}{2+n\sqrt{n}}$.
    1. $\lim \dfrac{(-1)^n n}{2n^2+3}=\lim (-1)^n\dfrac{ 1/n}{2+\frac{3}{n^2}}=0$ em que o último passo corresponde a notar que a sucessão é um produto de uma sucessão limitada por um infinitésimo.
    2. $\lim \dfrac{4^{n+1}-n^{10}}{n^8+4^n}=\lim \dfrac{4-\frac{n^{10}}{4^n}}{\frac{n^8}{4^n}+1}=4$ em que se usou $\lim\frac{n^p}{c^n}=0$ se $p\in\mathbb{R}$ e $c\gt 1$.
    3. $\left|\dfrac{1-\sen(3^n)}{2+n\sqrt{n}}\right|\leq \dfrac{2}{n\sqrt{n}}\to 0$ pelo que o limite existe e é $0$.
  4. Considere a função $f:\mathbb{R}\setminus\{0\} \to\mathbb{R}$ dada por \[ f(x)=\begin{cases} \frac{\pi}{2}+\arctg\frac{1}{x}, & \text{se $x<0$,}\\ \frac{x}{1+x^2}, & \text{se $x>0$.} \end{cases} \]

    1. Calcule $\displaystyle\lim_{x\to -\infty}f(x)$ e $\displaystyle\lim_{x\to +\infty}f(x)$.
    2. Justifique que $f$ é diferenciável e obtenha a função derivada $f'$.
    3. Verifique que existe o prolongamento por continuidade $F$ de $f$ ao ponto $x=0$.
    4. Determine os intervalos de monotonia e os extremos locais de $F$.
    5. Determine justificadamente o contradomínio de $f$.
    1. $\displaystyle\lim_{x\to -\infty}f(x)=\displaystyle\lim_{x\to -\infty}\left(\dfrac{\pi}{2}+\arctg\dfrac{1}{x}\right)=\dfrac{\pi}{2}$ e $\displaystyle\lim_{x\to +\infty}f(x)=\displaystyle\lim_{x\to +\infty}\dfrac{x}{1+x^2}=0$.
    2. Tanto em $\mathbb{R}^-$ como em $\mathbb{R}^+$, $f$ é diferenciável: de facto, em $\mathbb{R}^-$ trata-se da soma de uma constante com a composta de duas funções diferenciáveis ($\arctg$ e uma função racional) e em $\mathbb{R}^+$ a função é racional. Além disso, $f':\mathbb{R}\setminus\{0\} \to\mathbb{R}$ é dada por \[ f'(x)=\begin{cases} -\dfrac{1}{x^2+1}, & \text{se $x<0$,}\\ \dfrac{1-x^2}{(1+x^2)^2}, & \text{se $x>0$.} \end{cases} \]
    3. Como $\displaystyle\lim_{x\to 0^-}f(x)=\displaystyle\lim_{x\to 0^+}f(x)=\displaystyle\lim_{x\to 0}f(x)=0$, a função é prolongável por continuidade ao ponto $0$, sendo o prolongamento $F:\mathbb{R} \to\mathbb{R}$ dado por $F(x)=f(x)$ se $x\neq 0$ e $F(0)=0$.
    4. Tem-se $f'(x)\gt 0$ para $x\in{]0,1[}$ e $f'(x)\lt 0$ para $x\in{]-\infty,0[}\cup {]1,+\infty[}$. Logo $F$ é estritamente decrescente em $]-\infty,0[$ e estritamente crescente em $]0,1[$, pelo que tem um mínimo local em $x=0$ com $F(0)=0$. Sendo também estritamente decrescente em $]1,+\infty[$, tem um máximo local em $x=1$ com $F(1)=1/2$.
    5. Sabemos já que $f$ é estritamente decrescente em $]-\infty,0[$. Considerando também os limites para $0$ e $-\infty$, o teorema do valor intermédio garante que $f({]-\infty,0[})={\left]0,\frac{\pi}{2}\right[}$.
      Analogamente, usando o que sabemos do crescimento de $f$ em $]0,1]$ e em $[1,+\infty[$, os limites para $0$ e $+\infty$ e o teorema do valor intermédio, verificamos que $f({]0,+\infty[})={\left]0,\frac{1}{2}\right]}$.
      Assim o contradomínio de $f$ é $\left]0,\frac{\pi}{2}\right[$.

      Gráfico da função f
  5. Seja $\varphi:\mathbb{R}\to\mathbb{R}$ uma função diferenciável tal que $\displaystyle\lim_{x\to -\infty}\varphi(x)=\lim_{x\to +\infty}\varphi(x)=-\infty$. Prove que existe $c\in\mathbb{R}$ tal que $\varphi'(c)=0$.

    Sugestão: Comece por verificar que existem $a<0$ e $b>0$ tais que $\varphi(a)<\varphi(0)$ e $\varphi(b)<\varphi(0)$.

    1ª versão

    Que existem $a,b\in\mathbb{R}$ com $a\lt 0 \lt b$ tais que $\varphi(a)<\varphi(0)$ e $\varphi(b)<\varphi(0)$ decorre de $\displaystyle\lim_{x\to -\infty}\varphi(x)=\lim_{x\to +\infty}\varphi(x)=-\infty$. A restrição da função $\varphi$ ao intervalo $[a,b]$ terá, pelo teorema de Weierstrass e continuidade das funções diferenciáveis, um máximo num ponto $c\in{]a,b[}$ (pois $\varphi(0)\gt \varphi(a)$ e $\varphi(0)\gt \varphi(b)$). Devemos ter então $\varphi'(c)=0$.

    2ª versão

    Como na versão anterior estabelece-se que existem $a,b\in\mathbb{R}$ com $a\lt 0 \lt b$ tais que $\varphi(a)<\varphi(0)$ e $\varphi(b)<\varphi(0)$. Note-se que $\varphi$ é contínua pois é diferenciável. Suponha-se que $\varphi(b)\lt \varphi(a)$. Então, pelo teorema do valor intermédio, existe $c\in {]0,b[}$ tal que $\varphi(c)=\varphi(a)$. De forma análoga, se $\varphi(b)\gt \varphi(a)$, existe $c\in{ ]0,a[}$ tal que $\varphi(c)=\varphi(b)$. Assim existem dois pontos distintos onde $\varphi$ toma o mesmo valor. Aplicando o teorema de Rolle a $\varphi$ no intervalo limitado por esses dois pontos, obtemos a conclusão pretendida.


Última edição desta versão: João Palhoto Matos, 25/10/2018 15:10:16.